Não é estranho que os actores políticos e mediáticos ( incluindo os comentadores) estejam dissonantes até ao osso - o momento é gravíssimo mas continuamos a fazer política exactamente como fizemos até hoje -, porque existem factores que o explicam muito bem.
Os políticos de hoje são quase todos os dirigentes associativos de ontem: domesticados, ignorantes para além dos títulos das lombadas e profissionalmente dependentes dos aparelhos partidários. Os jornalistas e comentadores de hoje são quase os mesmos que durante todos estes anos levaram ao monte os tais políticos. Entretiveram-se com intrigas de cordel, quase todas passadas na pequena Lisboa, e não me esqueço que troçaram de Manuela Ferreira Leite quando esta se limitou a constatar, em 2008, o que agora aqueles declaram como evidente. Fazem parte do mesmo efeito de palco.
Depois, um segundo factor mais abrangente. O consenso sobre o "momento gravíssimo" é artificial.Os políticos e os comentadores dizem e escrevem o que julgam o povo querer ouvir. Imaginam que o povo quer ouvir perigo, gravidade, salvação. Se imaginassem que o povo queria ouvir receitas de bacalhau, papagueariam receitas de bacalhau.
O que se pode concluir é da encenação. O espectáculo de gente pequena, unicamente preocupada com sondagens ( e com o jogo da cadeira do FMI), a desdizer-se nas televisões, enquanto jornalistas e comentadores avençados anotam as falhas e as gaffes, é quase a única coisa real. O artifício reside na prova da própria realidade. Enquanto o público não reagir, o efeito de palco permanecerá.
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